A pauta conservadora a todo vapor.
Lasier: Vamos mexer com os brios de quem rende pouco. Muitos se atiram nas cordas porque se acomodam. Nossa intenção é atingir aqueles acomodados, os fantasmas e os indolentes, jamais o bom servidor” Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado
Lasier: Vamos mexer com os brios de quem rende pouco. Muitos se atiram nas cordas porque se acomodam. Nossa intenção é atingir aqueles acomodados, os fantasmas e os indolentes, jamais o bom servidor” Foto: Marcos Oliveira/Agência Senado
O Senado deve retomar, ainda neste semestre, uma
discussão polêmica que afeta a vida de servidores públicos efetivos em todo o
país: a fixação de regras para a demissão por baixo desempenho. O senador
Lasier Martins (Podemos-RS) se articula para puxar da Comissão de Assuntos
Sociais (CAS) para o Plenário uma proposta que, na prática, flexibiliza a
estabilidade do funcionalismo – tema considerado tabu no Congresso desde a
Constituição de 1988.
Lasier relatou o Projeto de Lei Complementar
116/2017, aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) em outubro de 2017, e busca o apoio do presidente
da Casa, Davi Alcolumbre (DEM-AP), e dos ministros da Casa Civil, Onyx
Lorenzoni, e da Economia, Paulo Guedes, para viabilizar a aprovação da medida.
Pela proposta, a avaliação será feita anualmente
por uma comissão e levará em conta, entre outros fatores, a produtividade e a
qualidade do serviço. Poderá ser exonerado quem receber nota inferior a 30% da
pontuação máxima por duas avaliações consecutivas ou tiver desempenho inferior
a 50% em três das últimas cinco avaliações.
Dos 27 governadores, 19 assinaram documento em que
sugerem flexibilização na demissão de servidores públicos.
Foto: Marcelo
Camargo/Abr
Para o senador, que foi um dos principais
articuladores da eleição de Davi Alcolumbre, as regras são necessárias para
“depurar” o serviço público e auxiliar no ajuste das contas públicas. “Vamos
mexer com os brios de quem rende pouco. Muitos se atiram nas cordas porque se
acomodam. Nossa intenção é atingir aqueles acomodados, os fantasmas e os
indolentes, jamais o bom servidor”, afirmou o parlamentar gaúcho ao Congresso
em Foco. “Vou dar um ‘ligeirão’ nele para levá-lo ao plenário. O governo
também quer a qualificação do serviço público”, acrescentou. Lasier já pediu
audiência com Onyx, com quem pretende abrir negociações no governo.
Tanto o relator quanto a autora do projeto, a
senadora Maria do Carmo (DEM-SE), defendem uma mesma avaliação periódica de
desempenho para todos os servidores públicos, sejam eles federais, estaduais ou
municipais. A justificativa é de que a regulação por cada ente federativo
levaria a regimes bastante diferenciados de aferição do desempenho funcional,
com reflexos sobre a extensão da estabilidade.
Reunião da CCJ que aprovou, em outubro de 2017, o
projeto que permite a demissão dos servidores públicos
por "insuficiência
de desempenho". Foto: Pedro França/Ag. Senado
O assunto, porém, não é pacífico. Advogados
trabalhistas consultados pelo Congresso em Fococonsideram que a
iniciativa só poderia partir do Executivo e que não há como uma mesma norma
estabelecer critérios para a avaliação para servidores federais, estaduais e
municipais. Eles entendem que cabe a governadores e prefeitos definir as regras
para o funcionalismo em seus respectivos estados e municípios. Sustentam,
ainda, que a demissão só pode ocorrer após esgotados todos os recursos em
processo administrativo. Entidades de classe ligadas ao funcionalismo
qualificaram a proposta, em audiências realizadas no Senado, como uma tentativa
de desmonte do serviço público.
Movimento em outras frentes
Além do projeto de lei complementar no Senado, há
outros dois movimentos em favor da flexibilização da estabilidade no serviço
público: um feito pelos governadores e outro por integrantes da equipe
econômica.
Em carta entregue ao presidente Jair Bolsonaro, em
novembro, 19 dos 27 governadores reivindicaram, entre outras coisas, mudança na
legislação para permitir que servidores efetivos sejam demitidos de maneira
mais célere. A medida, segundo eles, faz-se necessária em alguns casos para que
as contas públicas possam se enquadrar à Lei de Responsabilidade Fiscal (LRF).
A Constituição permite a demissão caso o limite com
despesas com pessoal não seja atendido. Esse teto, fixado pela LRF, é de 49% da
Receita Corrente Líquida para a União e de 60% para estados e municípios. Antes
disso, porém, o governo precisa reduzir em pelo menos 20% os gastos com cargos
comissionados e exonerar servidores que ainda não completaram os três anos de
estágio probatório. Mas os governadores alegam que esses desligamentos costumam
ser contestados na Justiça. De acordo com o Tesouro Nacional, 14 estados
comprometem mais de 60% de suas receitas com a folha de pagamento.
No fim do ano passado, o então ministro do
Planejamento, Esteves Colnago, entregou à equipe de transição do governo
Bolsonaro um documento sugerindo instrumentos para avaliação de desempenho dos
servidores. Colnago integra hoje o time de Paulo Guedes como secretário-geral
adjunto da Fazenda. Para ele, é necessário "aprimorar a possibilidade de
medir o desempenho dos servidores e caminhar para o processo de demissão".
O Congresso em Foco questionou o ministério se há alguma
proposta sobre o assunto em discussão. Mas ainda não houve retorno.
Regras de avaliação
Senadora Maria do Carmo é autora da proposta. Foto:
Jonas Pereira/Ag. Senado
O projeto relatado por Lasier regulamenta o artigo
41, parágrafo primeiro, da Constituição. Esse dispositivo já determina que o
servidor estável – após os três anos de estágio probatório – corre risco de
perder seu posto de concursado em caso de resultado insatisfatório “mediante
procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma de lei
complementar, assegurada ampla defesa”. O que o texto em discussão promove é a
definição de normas mais específicas para a execução de tais testes, com
pontuação por desempenho.
Em seu parecer, Lasier flexibilizou a redação dada
pela senadora Maria do Carmo ao, por exemplo, dobrar o período de testes a que
o servidor concursado com desempenho considerado insuficiente deverá ser
submetido – em vez de exame a cada seis meses, o senador propôs sabatina anual.
O relator também aumentou de um para três o número de avaliadores – no primeiro
texto, a tarefa cabia apenas ao chefe de departamento, situação que poderia
suscitar casos de perseguição.
De acordo com a proposta aprovada pela CCJ, essa
banca examinadora passaria a contar com um profissional de nível e setor
equivalentes ao do servidor examinado e outro do departamento de recursos
humanos. “A avaliação será feita anualmente por uma comissão de três pessoas.
Se o servidor tirar nota inferior a 3, ele ainda terá uma segunda chance. Se,
em cinco anos, não tirar nota 5, também passará por processo de exoneração. Ele
tem de ser eficiente”, defende Lasier.
Proteção constitucional
A estabilidade foi incluída na Constituição para
proteger o funcionário público de demissões arbitrárias e ilegais, sobretudo,
com as mudanças de governo. O texto constitucional estabelece que o servidor
público estável só perderá o cargo em virtude de sentença judicial transitada
em julgado, mediante processo administrativo em que lhe seja assegurada ampla
defesa; por meio de procedimento de avaliação periódica de desempenho, na forma
da lei complementar, assegurada a ampla defesa.
No processo administrativo disciplinar, a demissão
é a penalidade mais grave e pode ser aplicada àquele que praticou uma falta
gravíssima, cuja ação ou omissão causou prejuízo elevado ao órgão público, como
em caso de corrupção, por exemplo.
De acordo com o substitutivo, a apuração do
desempenho do funcionalismo deverá ser feita entre 1º de maio de um ano e 30 de
abril do ano seguinte. Produtividade e qualidade serão os fatores avaliativos
fixos, associados a outros cinco fatores variáveis, escolhidos em função das
principais atividades exercidas pelo servidor no período. Estão listados, entre
outros, “inovação, responsabilidade, capacidade de iniciativa, foco no
usuário/cidadão”. Depois da CAS, outras duas comissões precisam analisar o
projeto antes de ele chegar ao plenário caso Lasier Martins não consiga
abreviar a tramitação.